Viagem ao centro das coisas
Olá! Tudo bem? Tive uma resposta muito boa quando disparei a primeira Marolinhas. Isso me deixou bem animada pra seguir com esse canal de comunicação via e-mail, podendo falar com vocês de uma forma mais tranquila do que nas redes sociais.
Nessa newsletter vou abordar os seguintes assuntos:
// Primeira feira do ano!
// Um filme de Agnès Varda que me fez pensar muito
// Retratos de Maputo
// Primeira feira do ano!
Chegou a hora de sair da toca e colocar meu trabalho na rua :)
Em Fevereiro participarei da minha primeira feira do ano, a Feira E-cêntrica, em Goiânia. O evento reúne pequenas editoras, coletivos e artistas independentes, e conta também com uma extensa programação gratuita voltada para as artes e a literatura!
Esta será minha primeira feira na cidade, e vou lançar na ocasião a print Ingovernáveis, impressa em 3 cores em risografia.
A feira E-cêntrica vai acontecer nos dias 9 e 10/02 (sábado e domingo), das 10h às 19h, na Vila Cultural Cora Coralina (Rua 3, s/n - St. Central).
A entrada é gratuita.
Vou aproveitar a viagem pra dar uma esticadinha depois em Pirenópolis.
Dicas do que fazer, o que conhecer, onde comer e beber na cidade são super bem-vindas!
//// Importante ////
Por conta da minha viagem, a loja virtual estará fechada para pedidos entre os dias 6 e 18 de fevereiro. Se quiser encomendar alguma print, pin ou zine pela internet, a hora é agora ;)
// Um filme de Agnès Varda que me fez pensar muito
Quem me acompanha nas redes sabe que há algum tempo eu procuro consumir mais obras realizadas por mulheres. Eu ainda não havia feito esse movimento de forma consciente para os filmes que assistia. Neste mês resolvi tirar o atraso e conhecer os filmes de Agnès Varda. Um deles me deixou especialmente perturbada: As Duas Faces da Felicidade ou, no original, Le Bonheur (1965).
Antes de ver o filme, já sabia que Agnès é considerada a única diretora mulher representante do movimento francês nouvelle vague, e que seus filmes buscam o protagonismo feminino. Historicamente fomos habituadas a nos ver através do olhar masculino que nos retrata, com raras exceções, de forma caricata ou incompleta. Quem melhor do que uma diretora para questionar no cinema a situação social em que se encontra a mulher?
O filme Le Bonheur conta uma história aparentemente muito simples (sem spoilers por aqui, prometo!): François, marceneiro e morador de um bairro de subúrbio, vive feliz com a esposa Thérèse, que trabalha em casa como costureira, e os dois filhos pequenos Pierrot e Gisou. Uma curiosidade é que esta família era uma família de fato, interpretando a si mesmos no filme. Talvez por isso Agnès tenha conseguido capturar tão bem a intimidade afetuosa entre os quatro personagens.
A vida é pacata, simples e feliz. Agnès mostra a rotina dos pequenos afazeres, os trabalhos domésticos de Thérèse, a rotina de François na marcenaria, as crianças brincando. Até que um dia François conhece Emilie, uma funcionária dos Correios. Eles se envolvem amorosamente, em paralelo à vida familiar de François, que acredita estar vivendo um momento de “adição de felicidade", amando esposa e amante simultaneamente e com igual intensidade. Não há um só elemento que interfira na harmonia e aparente suavidade da história... a não ser um único corte, profundo, seco e decisivo com o qual Agnès nos fere.
Agnès não nos dá uma resposta pronta na conclusão da história.
Os julgamentos, a moralidade, o incômodo é deixado inteiramente para quem o assiste. Com um desfecho tão aberto, fiquei curiosa para ler as opiniões de quem o assistiu. E uma coisa me chamou a atenção.
Em geral, as críticas masculinas giram em torno de que a felicidade é possível, mesmo na simplicidade e nas adversidades da vida. As análises masculinas também discorrem muito sobre a estética do filme, o uso das cores e da fotografia incrível de Agnès. Alguns falam que a diretora oferece um olhar provocante sobre a monogamia e a instituição da família tradicional, sugerindo que outras formas de felicidade são viáveis.
Mas, viáveis para quem?
Alguns críticos parecem se esquecer que, para que uma relação aberta possa acontecer, é preciso que ambas as partes estejam de acordo – e não um acordo sutilmente imposto à mulher, mas estabelecido de forma horizontal, na qual ambos tenham limites e liberdades equivalentes. Nesta crítica às amarras da monogamia, a mulher também teria o direito ao amor livre? Ou seria essa busca pela adição de felicidade do personagem de François apenas uma reafirmação dos privilégios masculinos?
O desenvolvimento da história e o desfecho me causaram um incômodo profundo, que não encontrava saída na estética nem na narrativa do filme, que é toda bela, colorida, suave. Me parecia não haver uma rota de fuga pro meu desconforto, que queria se rebelar contra o círculo vicioso que a história propõe, condenando a mulher a desempenhar papéis específicos. Importante lembrar que este filme foi lançado numa época em que a liberdade sexual e os costumes foram amplamente discutidos, questionados, e, em alguns pontos, rompidos. E acho que está aí a ironia de Agnès, embrulhada por tantas imagens luminosas de girassóis, crianças sorridentes e planos coloridos, e que talvez passe despercebida para tantos olhares masculinos – dentro dessa felicidade reivindicada, o quanto de liberdade é permitido para a mulher?
O filme Le Bonheur me despertou muitas sensações intensas e confusas. Certamente vou levar algum tempo assimilando o que vi.
Assista ao trailer do filme Le Bonheur por sua conta e risco - ele está *CHEIO* de spoilers:
Pra quem tiver interesse em assistir mais filmes dirigidos por mulheres, encontrei um site brasileiro que reúne críticas e listas com algumas indicações:
mulhernocinema.com
// Retratos de Maputo
Pra finalizar essas marolinhas, uma indicação de fotógrafo que tenho acompanhado pelo instagram: @photo_in_moz. No seu perfil só sabemos seu nome e localização: Grég E. vive em Maputo, Moçambique.
Duas coisas me chamaram a atenção nas fotos de Grég: a série de retratos de pessoas carregando objetos - os mais variados possíveis - na cabeça; e as mães carregando crianças em panos amarrados – o que alguns por aqui chamam de sling. É lindo demais.
Deu vontade de falar alguma coisa?
Fale comigo :)
Um abraço,
lari.